Planeta Copa

Copa não é lá um ambiente muito confiável para contratar jogador

UOL Esporte

Por Duncan Castles*

O Real Betis bateu o recorde mundial de 31 milhões de euros da época para comprar Denilson do São Paulo logo depois da Copa do Mundo de 1998. O Liverpool sacou 15 milhões de libras de sua conta bancária pelos jogadores internacionais do Senegal El Hadji Diouf e Salif Diao, enquanto Sir Alex Ferguson esbanjou 6,5 milhões de libras do Manchester United com Kleberson após a Copa da Coreia-Japão em 2002. O Tottenham Hotspur se convenceu de que era uma boa ideia concordar com uma taxa de transferência de 8,3 milhões de euros por Didier Zokora depois que ele impressionou jogando pela Costa do Marfim em 2006. Quatro anos mais tarde foi Sunderland que entregou um cheque de 13 milhões de libras para Asamoah Gyan, o centroavante que liderou Gana até às quartas de final na África do Sul.

Um olheiro experiente gosta de contar a história de quando o Barcelona recrutou Rustu Recber, considerado o melhor goleiro da Copa do Mundo de 2002 e contratado apenas pela força de seu desempenho no torneio. Depois da chegada de Rustu na Catalunha, o técnico de goleiros do Barça logo concluiu que a técnica do turco era fundamentalmente falha. A carreira do jogador na liga espanhola durou apenas quatro jogos.

Qual é o denominador comum de todas essas aquisições de Copa do Mundo? Grandes quantias de dinheiro gastas em indivíduos que pareciam fantásticos no ambiente rarefeito – e sob muitos aspectos atípicos – do mês de extravagância do futebol. E decepções similares com o desempenho de cada um deles para seus novos empregadores depois que terminou a farra quadrienal.

À medida que o recrutamento de jogadores se tornou mais científico, com a maioria dos grandes clubes expandindo seus departamentos de olheiros, acrescentando análises de dados a essa avaliação e o julgamento de experiências de anos anteriores, a Copa do Mundo diminuiu em importância como mercado. Os principais clubes da Europa aprenderam acima de tudo que comprar por impulso depois de um dos torneios esportivos mais populares do planeta não é a estratégia mais confiável.

Na Inglaterra, o Arsenal abriu caminho na sistematização dos olheiros, extraindo um valor significativo do mercado de transferências, usando as habilidades de uma rede com cerca de 80 indivíduos. Nenhum deles viajará para o Brasil para assistir à Copa do Mundo no mês que vem.

Arsene Wenger estará no Brasil, combinando o comentário televisivo com uma rara oportunidade de assistir a um torneio internacional pessoalmente, mas ele considera enviar seus olheiros bem treinados para a Copa do Mundo uma perda de tempo e dinheiro. Sua equipe de tempo integral está focada em torneios internacionais mais produtivos, viajando em grupos de dois ou três para campeonatos sub-17 na América do Sul, por exemplo, onde os olheiros podem ver os jogadores pela primeira vez – e de preferência antes de outros clubes europeus. O Arsenal já tem relatórios sobre cada jogador convocado para a Copa do Brasil 2014.

O Chelsea, que vem se especializando em adquirir talentos globais, terá uma presença física no torneio, mas não espere que isso altere os planos de recrutamento de verão da equipe. Como o modelo do Arsenal que eles tentaram imitar, o princípio é ter estudado cada jogador muito antes de ele ter sido selecionado para uma Copa do Mundo.

Os clubes da Premier League com redes de olheiros menos desenvolvidas veem ''a segurança e a viagem como principais preocupações'' e têm dificuldades de enxergar o valor dos pacotes corporativos para olheiros que podem custar mais de mil libras por dia. Enquanto alguns comparecerão, a solução padrão será monitorar os jogos em vídeo em combinação com estatísticas detalhadas de rendimento individual ao estilo ProZone lançadas na Copa do Mundo da África do Sul, há quatro anos.

''Para mim, Brasil 2014 é uma perda de tempo e dinheiro'', diz um dos principais olheiros europeus. ''O país já é caótico sem uma Copa do Mundo. Com a Copa do Mundo, ficará pior. Levará horas para ir e voltar dos jogos. Haverá protestos, haverá violência, haverá assaltos.''

Se a era em que a Copa do Mundo era uma oportunidade para identificar novos talentos acabou, este torneio terá outro tipo de impacto no mercado de transferências. Os jogadores ainda não estão renovando contratos na esperança de que jogar uma boa Copa do Mundo possa aumentar seu valor de mercado. Os clubes que estão vendendo seus talentos preciosos subirão o preço com base nos desempenhos que chamarem a atenção.

Se você é o um jogador de futebol, a Copa é o melhor lugar para se estar. Mas se você é um olheiro de um dos clubes de elite da Europa, a Copa do Mundo mal se classifica.

*Duncan Castle é jornalista esportivo e escreve para  The Sunday Times, Sports Illustrated, Champions magazine, Goal, ONE World Sports, entre outros veículos.